Pills

Pills

30 de out. de 2015

THE REPLACEMENTS - DA ANARQUIA À AUTOSSABOTAGEM


Os Replacements ficaram com a fama da “banda que seria grande”, porém, mesmo em uma grande gravadora e com a MTV a esperar seus clipes, eles foram anárquicos até o final, - uma referência torta porém fundamental para os primórdios da música independente norte-americana...



O novo “Do It Yourself”


 O panorama no início da década de 1980 era de uma ressaca sombria após a festa colorida dos anos loucos de 1960-70. O frenesi do Punk tal qual explodiu em Londres já era passado, as bravatas cínicas de Malcom McLaren eram passado, o extermínio midiático dos Sex Pistols e a miscelânea Dub-psicodélica dos Clash sedimentaram o fim de uma etapa. Ficou um certo vazio, bem ambientado nos distritos áridos norte-americanos. 
Em Las Vegas, por exemplo, o Black Flag descobriu que poderia, sem o ônus da perda do espírito punk rock, castigar a sua van poeirenta atrás do diálogo com outras bandas de outros estilos – inclusive bandas psicodélicas ! O Minutemen flertou e aderiu a um certo espírito jazzy em seus espasmos de 3 minutos. Pelos lados de Minneapolis, o Husker Dü demonstrava que a introspecção também cabia dentro do punk rock: “Somos como repórteres do nosso próprio estado mental”, diria Bob Mould. Por fim, Paul Westerberg conduziu os Replacements a um espectro poético que unia o lado mais country dos Rolling Stones ao grito da rua dos New York Dolls - tudo temperado com a alma do Big Star.
Através desse caleidosópio, surgia um novo underground norte-americano, com a alma punk rock ainda correndo nas veias. Mas havia a necessidade de se aprender a explorar mais os instrumentos; os novos tipos de descontentamento e subjetividade que nasciam, exigiam muito mais do que os famigerados três acordes punks: o ódio a “música dos hippies” ficou sem sentido pois agora havia um choque de realidade que obrigava aos novos undergrounders, através de uma nova estética de composição, reconhecerem o valor das bandeiras do passado tais como a opressão, o racismo, o amor livre e o imperativo do consumismo - e sobretudo, utilizá-las.


Insatisfeitos


Havia algo que não se encaixava muito bem... sempre houve algo que não se encaixava muito bem. Poderia ser essa a linha pela qual Paul Westerberg, vocalista e a figura central na história dos Replacements, sempre caminhou – ou se equilibrou: “Sinto como nunca fizesse a música que eu gostaria de fazer, não sei como exprimir isso” e foi essa, justamente, a forma de expressão dos Replacements: nunca saber inteiramente o que se quer - Let it Be, - que não por acaso é o nome do terceiro álbum da banda, pelo pequeno selo Twin Tone Records, que fez os Replacements surgirem como um meteoro partindo de Minneapolis à incipiente cena alternativa norte-americana em 1984.
Foi preciso que Westerberg rompesse com a urgência da música feita a partir dos riffs da guitarra punk de Bob Stinson dos dois primeiros discos dos Replacements para que a música fosse feita a partir do lirismo das suas composições: e esse foi o grande salto de inventividade da banda. Foi esse diferencial que fez a banda chegar a uma grande gravadora, a Sire Records, com o álbum Tim (1985).   Nesse ótimo álbum, manteve-se a mesma abertura para outros estilos de música como em Let It Be (1984), - desde o rockabilly de “Weitress in the Sky” à música pop de “Kiss me on the bus”, porém, todas com uma vibe de crueza, desencanto e um certo desleixo adolescente passados pelo vocal rouco de Paul Westerberg: sem dúvida um dos mais pungentes do rock´n´roll. Também faz parte desse grande álbum o hino absoluto dos Replacements: “Bastard of Young”.



Juventude Bastarda

   
Em diversas ocasiões, Paul Westerberg insinuava que toda a geração precisava de um hino, algum marco de descontentamento vindo através de alguma obra de arte. Com “Bastard of Young”, os Replacements fizeram a sua parte. “Somos os filhos do nada, juventude bastarda “, é o grito dos Replacements ao american way of life, ao começo da famosa “década perdida”, à mecanização dos gestos e à música cada vez mais performática através, sobretudo, dos videoclipes sob encomenda da MTV.
“Bastards of Young”, por ironia, foi o primeiro pedido da MTV aos Replacements. O resultado, como não poderia deixar de ser, foi um dos videoclipes mais ácidos da história - na medida em que nele, nada acontece. Não há cores, não há a banda e nem as várias tomadas e ângulos sensuais e sensoriais que atiçam a imaginação dos telespectadores. Há simplesmente um aparelho de som tocando a música “Bastards of young”, uma sala simples, um ouvinte fumando impacientemente que, ao final da música, chuta o aparelho de som e sai da sala. Pronto. Aos entendedores, estava dado o recado.

(Clipe de "Bastards of Young")

Não obstante o fato de ter “fraudado” a MTV com o clipe “avant-garde” e debochado de “Bastards of Young”, há também na lista de embaraços causados pelos Replacements, uma apresentação no Saturday Night Live em 1986 com os integrantes da banda totalmente bêbados, não conseguindo terminar as músicas e constrangendo a emissora a chamar intervalos comerciais fora de hora. Tudo isso, somado ao fato de Paul Westerberg gritar um sonoro “Fuck You” em frente as câmeras. 
Estava assim pavimentado o caminho da decadência daquela banda promissora, na visão da grande indústria musical. Os Replacements ainda lançariam o bom álbum “Please To Met Me (1987)” dando indícios de que haviam finalmente parado com os excessos de drogas e álcool e tinham resolvido chegar num consenso com a grande mídia. Mas o tempo havia passado para eles.



Tudo Deu Errado ?


   
Mas, o que poderia explicar o fato de uma banda suar tanto para chegar a uma grande gravadora, ter a chance de “estrear” na MTV e em programas nobres da TV, lançar dois discos antológicos (Let It Be e Tim) muito bem recebidos pela crítica especializada, possuir um dos melhores e mais versáteis letristas de sua geração e, mesmo assim, ofuscar-se ?
Porém, ofuscar-se em relação ao quê? “Que confusão com a escada para o sucesso, quando você avança um degrau o anterior já está se apagando”, diz o primeiro verso de “Bastards of Young” - talvez ele nos dê a resposta: o problema pode estar na referência. Invertendo-se os pólos, se a insatisfação com um sistema falho de projetos e esperanças for a referência, talvez os Replacements tenham triunfado, e muito. Dentro dessa perspectiva, seguramente podemos colocar os Replacements ao lado do Husker Dü e do R.E.M como os três pilares sobre os quais toda a cena underground norte -americana futura foi se solidificando.



DISCOGRAFIA E DADOS TÉCNICOS




     Paul Westerberg   (Vocais e composição)
     Bob Stinson   (Guitarra)  /  Slim Dunlap (Guitarra, a partir de 1986)
     Tommy Stinson  (Baixo)     Chris Mars (Bateria)


     Minneapolis, EUA


     Discografia:

     Sorry Ma, Forgot To Take Out The Trash (1981)
     Hootenanny (1983)
     Let It Be (1984)
     Tim (1985)
     Please To Met Me (1987) 
     Don´t Tell a Soul (1989) – trabalho com músicas solo de Paul Westerberg
Comentários
0 Comentários

Nenhum comentário :

Postar um comentário